Polêmico e subversivo, o funk MTG se fez relevante na cena musical metendo o pé na porta. Desde novembro de 2023, a sigla ganhou destaque especialmente nas redes sociais após a retrospectiva do Spotify e também juntou forças com o grime e phonk, gêneros que tiveram força no Brasil graças a DJs como MU540 e Deekapz.
O Frankenstein do MTG
O fenômeno é subgênero do funk carioca que se apropria de diversos estilos musicais brasileiros, como hip-hop, trap e plug. A sigla “MTG” faz referência a palavra montagem, termo que encapsula a natureza mistureba das músicas, combinando diversos trechos em uma única faixa. Entre os nomes mais notáveis do gênero, destaca-se MC Ryan SP, que foi um dos artistas mais ouvidos no Brasil em 2023.
Este fenômeno de identificação rápida com o público, através da utilização de músicas conhecidas, tem impulsionado a popularidade das montagens. Contudo, a explosão do MTG pode ser atribuída à sua presença marcante nas plataformas de streaming e redes sociais, consolidando o gênero como uma tendência musical significativa. No Spotify, três faixas MTG estão entre as 15 mais tocadas no país. A música do DJ Topo, “MTG Quem Não Quer Sou Eu”, que inclui trechos da canção de mesmo título do Seu Jorge, segue no topo da playlist Top 50 Brasil.
A viralização das faixas no TikTok se tornou um fator determinante para o sucesso das montagens. Uma das pérolas do gênero, é a “MTG Chihiro”, uma montagem da música “Chihiro” de Billie Eilish. DJ Mulú, o responsável pela montagem, conta que a combinação do vocal poderoso de Billie com a batida de funk criou uma mistura mágica que rapidamente se tornou viral. No TikTok, o áudio foi reproduzido mais de 50 milhões de vezes.
Polêmicas e controvérsias
A popularidade das MTGs também trouxe polêmicas, principalmente relacionadas a questões de direitos autorais. Muitas montagens são lançadas sem a devida autorização dos artistas originais, o que gerou preocupações no setor musical. A cantora Billie Eilish, por exemplo, não autorizou o uso de sua voz na montagem de “Chihiro”.
Além disso, Mulú também enfrentou dificuldades para obter autorização oficial para lançar “MTG Chihiro” e teve que lidar com versões ilegais sendo publicadas no Spotify.
A Universal, responsável pelos direitos da música de Billie Eilish, inicialmente mostrou-se reticente em liberar remixes não oficiais. Mulú contou, em entrevista para o G1, que seu contato na Universal mencionou que “a possibilidade existe, mas não descartaria lançar como cover ou versão brasileira como um plano B”. Até que a solução encontrada foi substituir os vocais da cantora norte-americana pela Duda Beat, permitindo que a MTG fosse lançada oficialmente.
A apropriação de músicas sem a devida autorização tem sido um ponto crítico, gerando tensões entre produtores de MTG e artistas originais. O Setor Musical brasileiro, formado por entidades como Ecad, Amar, Assim, Sbacem, Socinpro, UBC, UBEM, ABMI e Pro-Música, emitiu um comunicado alertando sobre a proliferação de faixas de MTGs sem autorização. Segundo o comunicado, muitas dessas faixas desrespeitam os direitos autorais, gerando prejuízos aos autores originais. A nota enfatiza a necessidade de formalizar o uso de obras musicais preexistentes, respeitando os direitos dos compositores.
“As montagens atualmente disponibilizadas pelas plataformas estão valendo-se de obras musicais, interpretações e fonogramas protegidos sem que os legítimos titulares de direitos autorais as tenham autorizado”, afirma a nota. “Trata-se de grave violação civil e criminal”, completa o comunicado.
O mercado fonográfico brasileiro, onde 87,1% das receitas totais em 2023 foram provenientes do streaming, tem sido diretamente impactado pela proliferação das MTGs. Segundo a Pro-Música, o crescimento do mercado em 2023 foi majoritariamente influenciado pelas receitas de streaming, que subiram 14,6%, atingindo R$ 2,5 bilhões. A nota também destaca a urgência de regulamentar a distribuição de MTGs:
“As Entidades instam as plataformas digitais para interromperem imediatamente as disponibilizações e monetizações de MTGs não autorizadas e preservem os direitos dos legítimos titulares, sob pena de responder por sua negligência e imperícia na oferta ilegal de obras e produções.”
As gravadoras estão divididas quanto ao fenômeno MTG. Enquanto algumas veem o movimento como uma forma inovadora de remixar e revitalizar músicas antigas, outras expressam preocupações sobre a falta de controle e a violação de direitos autorais.
Para legitimar o espaço das MTGs e garantir que todos os envolvidos se beneficiem, é importante estabelecer um processo claro de autorização e distribuição de royalties. As plataformas de streaming precisam implementar mecanismos rigorosos para verificar a legalidade das faixas antes de disponibilizar. Além disso, os artistas e os DJs também precisam ser incentivados a buscar essas autorizações e reconhecer os direitos de quem está na composição original das músicas.
A cooperação entre DJs, artistas e gravadoras pode transformar o MTG em um movimento sustentável e benéfico. A criatividade e inovação do gênero não devem ser suprimidas, mas reguladas de maneira a respeitar os direitos de quem está envolvido, além de trazer uma didática justa para o movimento do MTG.