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Amor, lágrimas, euforia: clima de final com ida e volta para o Oasis em Buenos Aires e SP

Ver os irmãos Gallagher e seus escudeiros retornarem à ‘Manchester latina’ do Rio da Prata — onde são lendas — e à terra da garoa, que ainda haveria de coroá-los, foi testemunhar a história acontecendo junto a mais de 300 mil pessoas.

A turnê de reunião do Oasis mexeu com as emoções de muitos seres humanos ao redor do mundo no ano de 2025. Após 16 anos de inatividade, uma das bandas mais amadas, confiantes e ao mesmo tempo divisivas do Rock britânico remediou suas feridas abertas e atendeu ao clamor popular por uma nova oportunidade de poder testemunhar a combustão e o encantamento que apenas o repertório do Oasis é capaz de despertar. “É isso aí, isso está acontecendo”, dizia o anúncio de uma reunião improvável, mas não inesperada. 

 

Seriam 41 apresentações ao redor do mundo. Eu teria que aguardar justamente pelas 5 finais, na América do Sul. Eu nunca tinha visto o Oasis antes, sou um entusiasta mais recente. Apesar de ter nascido em 1990, eu nem sabia falar quando Definitely Maybe mudou o rumo do rock tocado na ilha britânica em 1993 – e quando (What’s The Story) Morning Glory? saiu em 1995, eu me lembro mais dos 2 dentes de leite da frente que perdi e do nascimento da minha irmã que de nomes como “Wonderwall” e Champagne Supernova”, que só fariam sentido no meu vocabulário já perto dos anos 2000. 

 

Obcecado por futebol, como muita criança dos anos 90, bandas como Blur e Oasis começaram a aparecer na minha vida na trilha sonora de jogos como FIFA, de reportagens sobre a rodada da Champions League, obviamente na programação da MTV e assim, próximo a virada do milênio, uma música ou outra do Oasis achou o seu caminho na curadoria dos meus primeiros CDs “queimados” e playlists em mp3 nos anos seguintes. Muito brasileiro da minha idade engatou em Oasis também através do filme Efeito Borboleta (2004), protagonizado por Ashton Kutcher e que tem “Stop Crying Your Heart Out” como trilha da cena clímax, encerrando o suspense.

 

Já algumas décadas no futuro, a vida sozinho na capital, a pandemia e a corrida de rua mudaram muitos hábitos na minha vida, à força às vezes, e eu precisei me tornar uma pessoa mais ativa e confiante na vida, por conta própria – e isso é papo para terapia, mas a companhia da discografia do Oasis se tornou combustível para momentos de determinação, mais confiança e esperança em fazer as coisas acontecerem em um âmbito pessoal, se posso dizer isso sem soar como um post de Linkedin manjado.

 

Diferente de todas as outras bandas que você pode ouvir disponíveis no catálogo do Spotify, o Oasis é uma das poucas em que considero as versões ao vivo muito superiores às de estúdio – mais improviso, sujeira, bateria mais presente, criativa, “solta”, os irmãos tentando se superar como em uma competição, ou apenas sendo a dupla que melhor harmoniza na história da música. O vocal elétrico de Liam envelhece ganhando notas mais graves que o ajudam a soar mais maduro, os solos de Noel ganham proporções bíblicas.

Enfim, Oasis ao vivo é outra coisa – o povo dá show junto, na Inglaterra, no Japão, no Brasil, mas principalmente em um outro destino sul americano: a Cidade Autônoma de Buenos Aires, Argentina. E é pra lá que eu fui vê-los primeiro.

Show de ida: Buenos Aires (River Plate), 16 de novembro de 2025

Eu estive em Buenos Aires pela primeira vez em 2022 – à época já tinha cansado de ouvir relatos sobre a empolgação digna de torcidas organizadas dos argentinos em shows de rock, um gênero ainda considerado como de massa entre a população da capital portenha. 


Quem nunca se impressionou com a performance dos hermanos durante o set do AC/DC no estádio do River Plate em 2009? Desde então eu queria muito ver um show em um estádio argentino. Se fosse do Oasis, melhor ainda. A lembrança da banda tocando “Don’t Look Back in Anger” com Noel Gallagher no “Monumental de Nuñez” também em 2009 para uma plateia apaixonada, mesmo quando estavam já em plena baixa na carreira, era incrível demais para ficar apenas na minha memória de espectador à distância, eu precisava testemunhar isso ao vivo.

Nessa viagem que fiz em 2022, o Metallica estava excursionando pela América Latina e passou por Buenos Aires durante a minha estadia. Contagiado pela empolgação dos metaleiros locais pelas ruas nos meus dias por lá, fiz a promessa: “quando o Oasis voltar, é aqui que eu vou assistir”.

Como promessa é dívida, fiz a minha, com o ingresso garantido desde novembro de 2024 e embarquei para Buenos Aires esse ano com minha família dois dias antes do primeiro show que os irmãos fariam na terra dos hermanos, em 15 novembro. Encontrei, assim como foi na passagem do Metallica três anos antes, uma cidade tomada por uniformes da fornecedora Adidas Originals para a turnê ‘Live 25 pelas ruas, bares, cafés, livrarias, estações de metrô, atrações turísticas e uma forte tendência ao uso do chapéu cata-ovo do Oasis debaixo do sol forte que deu as primeiras notas do que vem por aí no verão do hemisfério sul por lá. 

 

O turismo voltado ao consumo de shows respirava na capital argentina e atraiu não só brasileiros como eu, mas também peruanos, uruguaios, colombianos, britânicos, estadunidenses e até japoneses, chineses e coreanos, todos prontos para contribuir com a catarse dos Oasis-maníacos na “Manchester argentina”.

 

Outra coisa que encontrei por lá foi o livro Nuestro Oasis: Una Historia Argentina (Nosso Oasis: Uma História Argentina), do jornalista José Bellas (El Clarín, Rolling Stone Argentina) título recém-lançado no país e que relata a histórica relação do público local com o rock britânico não só do Oasis, mas dos Stones, Stone Roses, entre outras lendas do gênero. Os fãs que aproveitaram para conhecer a famosa livraria cartão-postal El Gran Ateneo Splendid na movimentada avenida Santa Fé, agarraram também as últimas cópias disponíveis da publicação.

 

Como a Argentina possui uma relação atribulada com a Inglaterra devido à Guerra das Ilhas Malvinas, o advogado e mestre em Economia Aplicada Juan Augusto Rattenbach, assessor do Museo Malvinas, citou em participação desse mês de novembro no podcast Cabaret Voltaire sua teoria de que o soft power argentino no pós-guerra gerou uma “argentinização das bandas britânicas” ao contrário da esperada “colonização” dos artistas locais. Essa relação está refletida no impacto que o público argentino gera nos artistas que ali fazem sua performance, criando uma química de troca em que, assim como as torcidas denominadas “número 12” cantam para incentivar seus clubes de futebol, as audiências de fãs em shows argentinos se tornaram “músicos convidados” em diversos momentos de uma noite de show, tanto nas atrações domésticas quanto nas internacionais, pela sua energia catártica pulando e cantando até riffs e solos de guitarra a plenos pulmões com uma devoção incansável – convertendo assim as bandas em fãs do ufanismo argentino.


Foram duas noites nesse clima de euforia no entorno e dentro do Estádio River Plate – um estádio “seco”, onde os fãs com ingressos não podem consumir bebidas alcoólicas, como costuma acontecer na grande maioria dos shows e festivais no país. A empolgação era tanta que Liam chegou a mencionar durante uma das apresentações o quão impressionante era que “mesmo com todos vocês sóbrios a loucura seja tão grande” e complementou com “Coisa de louco. Típica coisa de louco.”

 

O repertório, tanto dos shows em Buenos Aires quanto os de São Paulo, foi o mesmo do restante da turnê. A banda estava com o seu setlist fechado, redondo e alinhado às projeções nos telões e nas luzes nos estádios, sem espaço para improvisos ou mudanças de rota. As apresentações começaram com a frenética “Fucking In The Bushes” nos PAs, enquanto a banda entra no palco e Liam Gallagher faz a saudação “Vibes do Oasis na área! Vibes de Buenos Aires na área!” antes de entrarem em uma sequência brutal de 2 horas de hits como Hello, Morning Glory, Acquiesce, Some Might Say, Cigarettes & Alcohol, Roll With It, Supersonic, Little By Little, Stand By Me, Wonderwall, Live Forever, The Masterplan e Champagne Supernova, entre tantas músicas conhecidas em um show que mais parece um disco perfeito de Greatest Hits – e é! 

 

São 3 guitarras elétricas no palco (Noel Gallagher, Gem Archer, Bonehead), Liam Gallagher nos vocais com uma voz tão elétrica quanto o instrumento do irmão, Andy Bell no baixo, Joey Waronker (bateria) e Christian Madden (teclados). Algumas canções como Half The World Away e The Masterplan contaram também com uma sessão metálica de instrumentos de sopro.


Todos os demais vocais de apoio ficaram por conta das 150 mil pessoas que lotaram o estádio Monumental entre 15 e 16 de novembro, e puxaram constantemente entre as músicas, cânticos de torcida reconhecidos pelo Brasil como:

 

“Olê, olê, olê, olê

Olê, olê, olê, olê, olá

Olê, olê, olê, olê

Olê, olê, olê, olê, olá
A cada dia te quero mais,

Porque sou Oásis [detalhe, “Oásis” em espanhol mesmo, sem inglês!],

É um sentimento, que não pode parar!

Olê, olê, olê, olê…”

 

 

O fã brasileiro vai ter que controlar um pouco o ciúme, porque não faltaram declarações de amor tanto de Noel Gallagher quanto de Richard Ashcroft (responsável pela abertura dos shows) para a plateia portenha, reverenciada como “a número 1 do mundo” por ambos músicos – também muito influenciados pela cultura futebolística local e os atletas expoentes do futebol argentino que brilharam em campos ingleses, como Sergio Agüero, ex-jogador do Manchester City, amigo de Noel e que estava presente em ambas as noites no Monumental. Richard por sua vez, além de colocar os argentinos no topo do ranking (“Buenos Aires, a cidade ao vivo número 1 do mundo”), fez o seu show trajando a camiseta de Mario Kempes, ex-centroavante e condutor da seleção celeste à seu primeiro título de Copa do Mundo em 1978, na própria Argentina.

 

Após a queima de fogos em “Champagne Supernova” na última noite do Oasis em Buenos Aires, Noel se recusou a sair do palco e ainda puxou um canto de “Argentina! Argentina! Argentina!” que inflamou novamente o público ufanista, para coroá-los com uma noite digna de final de Libertadores que entrou para a história do estádio. 

 

Foi lindo ver aquele povo tão devoto à música, como nós, compartilhando sorrisos, lágrimas borradas e gritos de  ̶g̶u̶e̶r̶r̶a̶ amor – o Monumental é um estádio gigantesco que vibrava como se o River Plate tivesse levantado mais uma Copa Libertadores, mas a conquista ali havia sido a do reencontro com tempos mais simples, com as suas emoções, uns com os outros. Ao amigo que me cumprimentou e me abraçou enquanto éramos os poucos que cantavam “…while we’re living, the dreams we have as children fade away…” naquela parte do campo do River, mis saludos! Esses momentos jamais serão esquecidos.

Shows de volta: São Paulo (Morumbis), 22 e 23 de novembro ​

“O show do Oasis é maravilhoso: ninguém pega no celular, então tem sinal.” foi o que eu ouvi da boca de uma senhora soteropolitana que aguardava a condução em uma das barracas de lanche nos arredores do Estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbis, onde o Oasis havia feito sua primeira de duas apresentações esgotadas na cidade de São Paulo. 

 

São as aspas perfeitas para demonstrar o quanto esse show comoveu multidões que, em tantos momentos, apenas deixaram o presente as levarem, embaladas por emoções e uma sensação de estar vivendo novamente um momento no tempo onde você nem sequer precisava de um celular. Onde era mais importante botar o braço ao redor de uma pessoa querida e pular, cantar, beber, fumar e chorar com quem está ao seu lado. Os registros por celular também vieram, claro, nos dois países, porque o momento era digno de registros também. Certamente muitos fãs estão até agora assistindo em seus celulares lembranças do que viveram nesses estádios ao redor do mundo nos últimos meses.

 

Se na primeira noite em São Paulo o clima foi de uma grande confraternização entre fãs, no domingo as arquibancadas do Cícero Pompeu de Toledo vibravam como se fossem desabar, tremendo desde a primeira nota alta da caixa metálica de Fucking In The Bushes, enquanto algumas dezenas de copos de cerveja faziam trajetórias elípticas pelos ares da pista, que pulsava, decretando o início de uma rebelião de sentimentos até então armazenados por mais de uma década em fotos, memórias, playlists e sonhos. 

Braços abertos aos céus, refrões cantados como hinos, lágrimas e sorrisos se misturavam às luzes do palco e dos celulares acesos entre as 60 mil pessoas que testemunharam o retorno triunfal e histórico da banda mais confiante e divergente que o rock do Reino Unido já produziu. 

 

O refrão da música de abertura, Hello, não podia combinar melhor os sentimentos compartilhados entre banda e plateia: “Olá, é bom estar de volta!”

 

Era grande a presença de fãs de outros estados brasileiros, como Rio Grande do Norte, Ceará, Bahia, Rio de Janeiro, Santa Catarina, além de todos serem de faixas-etárias diversas. Conversei com um pai de Natal que estava com sua família na pista e que me deu o relato:  “Nós [pais] somos fãs, o mais velho [16] também. Os demais [caçulas] pegaram dele. É multigeracional.” – me contou ele. O comunicado pós-turnê da banda também reconheceu essa característica [“A força mais destruidora da cultura pop britânica recente encontrou o seu caminho para os corações e mentes de uma nova geração”], essa turnê não foi apenas nostálgica, ela foi também o primeiro contato de algumas gerações com os campeões do Britpop dos anos 90.

 

O Morumbis pulsou, cantou, chorou e vibrou por duas noites seguidas, em exibições de gala dos visitantes ingleses que trouxeram alegrias ao estádio – coisa que o próprio time dono da casa não foi capaz de entregar em 2025. A catarse coletiva do Oasis foi um sucesso estrondoso ao redor do mundo – nas duas datas de SP a ticketeira Ticketmaster revelou um balanço de faturamento de R$ 98,2 milhões apenas com ingressos. Isso sem contar o merch oficial, vendas de cerveja e comida, entre outros fatores econômicos. Já o veículo australiano DMARGE estimou que o faturamento total dos 41 shows da turnê ‘Live 25 chegam à cifra de pouco mais de 4 bilhões de reais (R$ 4.192.936.800,00).

Foi o maior show do planeta Terra em 2025 – e no que depender dos irmãos Gallagher, a dose bem que poderia se repetir no ano que vem. A seguir o comunicado da banda falando sobre uma “pausa para reflexão”, após a jornada que se encerrou no último dia 23 de novembro em São Paulo:

“Assim veio e se foi.

 

A força mais destruidora da cultura pop britânica recente encontrou o seu caminho para os corações e mentes de uma nova geração. De Gallagher Hill à River Plate, do Croke Park aos montes do Royal Canal e até a Cidade dos Anjos, o amor, alegria, lágrimas e euforia jamais serão esquecidos.

Agora haverá uma pausa para um período de reflexão.”

 

– Oasis

 

Liam Gallagher definiu no documentário Supersonic (2016) que ser um membro do Oasis era como dirigir uma Ferrari: “ótima de pilotar, linda e potente, mas que às vezes sai do controle”. A turnê ‘Live 25 provou que os irmãos se tornaram pilotos experientes e que certamente têm a capacidade de guiar a banda algumas vezes mais pelas estradas do planeta dando espetáculos dignos do topo do pódio. 

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