Há discos que nascem de estúdios, máquinas e colaborações planejadas. Outros, como BIG FA7HER, de Akira Presidente, nascem de uma vida inteira atravessada por perdas, reinvenções e amadurecimento. O rapper carioca, figura incontornável do rap nacional, retorna após quatro anos em um projeto solo para transformar sua história em herança sonora. Um testamento que é, ao mesmo tempo, pessoal e coletivo.
Gravado em meio à pandemia e às mudanças radicais em sua vida, o álbum de dez faixas mistura boombap e trap para costurar uma narrativa íntima, marcada por dor e a celebração da família. “Esse disco atravessou altos e baixos, alegrias e choros, mas sempre com resiliência e resistência”, disse Akira, em entrevista. “Eu me tornei uma pessoa melhor, e isso me levou a ser um MC melhor”.
O título não é à toa. BIG FA7HER carrega o peso e a delicadeza da paternidade. Em “Éramos Reis”, Akira divide o microfone com a esposa Ainá e a filha Nandi, num gesto de transformar sua música em legado afetivo. “A Nandi mudou muito a minha mentalidade. Ela me fez enxergar até meu próprio rap de outra maneira. Hoje, acho que sou um ótimo MC, mas tento ser um pai ainda melhor”, afirmou.
Esse tom íntimo convive com o vigor de colaborações que atravessam gerações. L7NNON, FBC, Yunk Vino, LEALL, VND e outros nomes emprestam suas vozes ao disco, numa troca que traduz respeito mútuo e continuidade. “Cada feat foi muito genuíno. São pessoas que cresceram ouvindo minha música, e trabalhar com essa galera trouxe motivação e uma energia de irmandade”, explicou.
Há também um aspecto estético que revela a maturidade do rapper. Produzido entre 2021 e 2024, grande parte do álbum foi gravada em casa, numa escolha que reforça a autonomia do artista. “Hoje eu brigo muito para ser dono do meu tempo. O luxo é poder fazer a minha música e trabalhar com ela do meu jeito. Talvez eu não tivesse energia para isso cinco anos atrás”, contou.
Esse caminho independente permitiu que Akira encontrasse prazer no processo criativo, mesmo em meio às dificuldades. “Eu consegui resgatar a felicidade de rimar, de compor. Foi doloroso, mas também foi divertido. Se eu não tivesse bem comigo mesmo, não refletiria no disco”, disse, lembrando a espontaneidade que contrasta com a velocidade da indústria atual.
Com BIG FA7HER, Akira reafirma-se como OG da cena e também como alguém capaz de traduzir as transformações de uma geração. Sua música, embora fincada no rap, busca falar além do rap. “Eu tento que minha arte afete, que provoque. Se ela não provoca nada, está sendo genérica. Quero que até quem não seja do rap consiga sentir alguma coisa”, resumiu.
Talvez seja por isso que o disco soa tão necessário agora: não apenas como produto de mercado, mas como um documento de resistência, herança e afeto. Um disco que olha para trás com gratidão, encara o presente com serenidade e projeta com esperança.
“Se o Akira de dez anos atrás me ouvisse hoje, ele reconheceria certas dores, mas se surpreenderia ao me ver mais saudável e com mais vontade do que naquela época”, refletiu. Em tempos acelerados, BIG FA7HER é, enfim, um convite a desacelerar e ouvir: a si, ao outro e à vida que pulsa no rap. Ouça o álbum na íntegra abaixo: