Na filosofia hindu, Maya é a ilusão que nos faz acreditar que somos apenas o que vemos. Para Janvi, rapper, skatista, beatmaker e produtora cultural nascida em Foz do Iguaçu (PR), seu primeiro álbum de estúdio, VEMSER (Central Records), é o momento de romper esse véu. “O projeto faz esse movimento de destruição criadora: quebra o espelho que só mostrava a superfície e constrói um reflexo mais profundo, alinhado com quem você é de verdade”, explica. “O espelho deixa de ser só um objeto de validação externa e vira um portal de autoconhecimento.”
A sonoridade de VEMSER é um mapa afetivo. Do Boombap ao Amapiano, do Brazilian Drum N’ Bass ao R&B, o disco reflete uma trajetória não linear e generosa em referências. “Eu fui influenciada ao longo da minha jornada por vários gêneros e pesquisas”, conta. “O jazz veio muito do berço do meu pai, o gospel da minha mãe, o boom bap da rua e do skate. O Amapiano entrou com a influência do produtor Safe. Nada está ali à toa — cada estilo carrega um pedaço da minha história e de quem caminhou comigo.”
No estúdio, a parceria com a Central Records deu corpo às ideias já lapidadas por Janvi e Safe. “Adicionamos instrumentos orgânicos, gravamos vozes e feats. É um álbum que explora o rap, mas dialoga com R&B e até Drum N’ Bass, equilibrando o eletrônico e o orgânico”, destaca Rico Manzano, produtor e cofundador do selo.
Origens e senso de comunidade
Essa caminhada também é atravessada por uma herança rara no Brasil: a ancestralidade indiana. “Meu pai me ensinou que eu posso fazer o que eu quiser e tenho que me arriscar”, diz. “Mas também me mostrou o quanto a gente passa por racismo, o quanto existe uma visão distorcida da Índia. Isso me dá um lugar de fala e o desejo de trazer debates e conhecimentos que vêm dessa cultura milenar.”
VEMSER também é semente de coletivo. Do disco nasceu o Laboratório VEMSER, que hoje conecta mais de 90 artistas, majoritariamente mulheres e pessoas LGBTQIA+, em um espaço de colaboração. “Eu sinto que os homens já têm essa estrutura de se ajudar, mas entre as minas ainda falta”, afirma. “Meu intuito era criar essa rede para que a gente troque, colabore e prospere juntas. Hoje temos um grupo no WhatsApp onde nos escrevemos, meditamos e marcamos projetos.”
Nas colaborações do disco estão Alra Alves (“Amanheceu”) e Muse Maya (“Ele Jura”), faixa que sintetiza a potência do encontro feminino e negro no rap. “Essas músicas falam de autoestima e de não deixar ninguém passar por cima da gente. Nas duas, começamos do zero, produzindo, editando, criando tudo. Tê-las nessas faixas é simbólico demais.”
Entre desafios técnicos — como a perda de um HD inteiro com registros audiovisuais — e recompensas pessoais, Janvi vê VEMSER como um portal aberto. “A maior recompensa é ver minha criança interior ali, saber que não é só sobre mim, mas sobre trazer um monte de gente junto. Algumas ideias não andaram, mas o tanto que deu certo é gigante. É um processo espiritual, de manifestar e experienciar.”
Ouça o álbum na íntegra:





























































































































